Poemas
Poema Nulo
Ninguém, alguém, ninguém, alguém.
Eu, quem? Eu, como? Eu, onde?
Nenhum verso à liberdade - nenhum!
Meus dias com insetos no estômago:
véu, breu, véu, breu, véu, breu.
e um mais, e um porém, e um ainda.
Que lindo par de mentiras ao fim do meu nome!
Plurais, quais? Restam-me a sombra, a dúvida.
Cela
Fizemos da vida prisão vermelha e branca
tão vermelha que extinguiu o espanto,
mais branca nos multiplos conformismos.
Nos trancamos num cofre à espera de alguém, certa chave.
Comparações não faltam entre o céu e a terra
e mais um e mais outro fim do mundo.
Tantos anúncios rasgam minha inutilidade!
Não há mais o que cavar, procurar ou defender
o jeito é pedir consolo ao vento.
Olha que o verso acaba, a vida, o tempo.
E toda a espécie de fingimento é um sono, uma fuga sobre o mar.
Salina
A lágrima borrou o primeiro ponto da poesia,
resta apenas uma mancha negra, salgada,
contudo ninguém pede nada, o sal basta.
Basta para completar o sentido do verso interrompido,
para nutrir a água no refrescar as plantas
ora sim, ora não, rodeada por sentimento.
No momento a lágrima secou, ficou o sal mais poético,
só o sal e o mal.
Já sabes, restou o sal com o verso em mancha.
Fez-me linha no horizonte e a montanha
recebeu todas as lágrimas cantadas, escritas,
montanha salgada, deformada pelo vento salgado.
Permissão para um poema
Repare só nas tardes da vida,
o pó se esconde sob a roupa, tantos ferimentos!
Não compreendes a dor, má atuação
perante a existência.
Ninguém, alguém, ninguém, alguém.
Sem cócegas na liberdade, é noite
e o globo corre descalço, à luz do medo.
O menino beija a testa do mundo,
cava buraco pra fugir do céu que cai.
Só o vento sabe que tudo nasce antes da hora.