Encarando o fim do Mundo

12/09/2011 14:51

 

            Seguidor fiel da Palavra, Teodoro tinha a certeza que o Fim do Mundo chegaria, e que esse dia seria 31 de Dezembro de 2000. Tal convicção ninguém lhe tirava, seguindo sua consciência e seu Deus, ele se preparava para acabar com todos os seus bens materiais e dignamente (em outras palavras, nu como veio ao mundo) entrar no Paraíso.

            Agricultor desde a tenra infância, filho da terra batida e da ignorância mórbida, Teodoro fazia da vida um exemplo de rendição ao sofrimento e, ao mesmo tempo, castidade. Morava sozinho no sitio Sant’ Ana, recebido como herança de seu avô. O sitio era cercado por uma imensa fazenda, por soja mais precisamente, e distante quarenta quilômetros da cidade mais próxima: Ubirajá.

            Aproximando-se o Ano Novo, Teodoro foi a cidade, ficou espantado com a calmaria na última semana do mundo. Como de costume, comprou somente o necessário, talvez menos que isso, mas pegou também algumas unidades de cachaça, “quero morrer bêbado”, pensou ele.

            A casa, modesta, uma dúzia de galinhas e seis cabras, além de uma horta de legumes e verduras variados. Tudo igual ao amanhecer do dia 31 de Dezembro de 2000. Mas Teodoro não, acordou confuso, rezando suado e bêbado. Após gritar em vão palavras inúteis e beber mais um pouco, acendeu algumas velas e espalhou o que restava de cachaça pela casa.

            O dia ia acabando e, para Teodoro, também sua vida.

            Dez para a meia-noite, marcava o relógio pendurado no centro de uma espécie de altar. Teodoro sentia a morte, por puro efeito da bebida. Jogou veneno n’água das cabras e das galinhas, passou pela horta abandonada a dias e pôs fogo na plantação de soja do vizinho e, ao voltar os olhas para sua casa viu-a pegando fogo, parece obvio tratar o incêndio como acidente, mas Teodoro preferiu chamar de “uma mãozinha de Deus”.

            Se Teodoro não tivesse dormido, veria que o céu da meia-noite estava deslumbrante, e se não tivesse tão bêbado poderia ouvir os fogos de artifício na fazenda do seu vizinho. Se seu vizinho não tivesse festejando a chegada do novo milênio poderia ter percebido a tempo e impedido que o fogo se alastrasse por sua plantação.

            Com o fogo se espalhando, os convidados para os festejos na “Fazenda Alto Azul” perceberam, tarde demais, o fogo tomando conta da plantação. A tudo isso, Teodoro dormia, a chuva caiu, também tarde, servindo para dispersar a fumaça apenas.

            Tomado pelo impulso, seu Casimiro, dono da fazenda, foi até o sitio de Teodoro. Vendo os bichos mortos, o agricultor embriagado (confuso por estar vivo) tentando levantar-se, nu, seu Casimiro diante a situação “ligou as pontas”, concluiu que o desgraçado era o culpado pela tragédia, pegou sua arma e matou-o com três tiros no meio da testa.

Amambaí, 27 de agosto de 2011.