O amor, por obséquio

19/03/2012 13:48

 

 

Sim, o amor existe. É cachorro sem dono e sem rumo, sim, o amor é louco. É jogador e às vezes pegajoso, sim, o amor cola. Coisa míope e sem juízo, sim, o amor é jovem. Peça em cima da cama, perfume que quase acalma, sim, o amor é tímido. Deus muito distinto, com manha e fieis nus, sim, o amor é flora. Madrugada sem ruído, fome insaciável, sim, o amor é casto. Delicado selvagem, à margem do nada, sim, o amor é riso. Cliente exigente, papo furado, sim, o amor é impreciso. Faz que si, diz que não, pensa e duvida, claro, o amor tece. Bordão incolor, sapato entre as pedras, sim, o amor prescreve. Aperitivo benéfico, curto ciúme, sim,  o amor corrói. Fase da lua, massagem do abismo, sim, o amor esgota. Desmedido e imposto, sim, o amor ensaia. Asilo do acaso, jogo do esquecimento, sim, o amor crucifica. Menino excêntrico, dilema impressionista, sim, o amor pinta e borda. Ordem de despejo, café da manhã, sim, o amor é domingo. Recalcitrante, pasmo, sim, o amor rarefeito. Golpe engenhoso, prisão transitiva, sim, o amor habita. Patético e solteiro, distraído e sem medo, sim, o amor é segredo. Agita ali, na rua, na praça, sim, o amor é confusão. Viagem sem rota, porta sem chave, sim, o amor inunda. Sob o modesto telhado, goteira sobre o leito, sim, o amor incomoda. Essa pressa toda, esse chove não molha, sim, o amor pertence a quem ama, sim, quem ama, engana. O amor é um engano. Amor não conhece paisagem, pisca, mas não fisga, marca. Sim, o amor fornece pausas. Útil ou inútil, sim, amor é ponto de vista. Tudo e mais tarde, amor rima, sim, mas não é liberdade. Quem sabe não ama, o amor, sim, o amor é sangue, um olhar-o-crepúsculo. Susto também é amor, sim , o amor sempre assusta. Amor não é moda nem fantasia, amor é corrida, diário, bilhete atrás do armário. O amor se define, recusa definições. O amor é bobo demais pra ser verdade. Amor é prejuízo, sem exceção. Amor não é um mais um; é mais que dois. Amor é anti-horário. O amor não grita nem esperneia, quando triste, só boceja. Amor é quase liberdade, é vadio e ilimitado. Sim, poeta, amor é! Amor é tudo o que não foi dito.

 

 

Maxsuel M. Lênihon