Entre as coisas, um verso...

29/09/2011 16:23

 

Um anjo doce se aproximou e disse:

−Desejas alguns versos que acabo de colher em florestas densas e perfumadas?

Não esperou que eu respondesse; jogou-me meia dúzia de poesias e partiu rumo aos céus.

 

Entre as vontades

 

Essa vontade imensa que tenho

de, com uma pena, escrever um verso.

Essa vontade imensa que tenho

de, com um sopro, tornar um verso eterno.

Essa vontade imensa que tenho

de, com um gesto simples, tornar finito o eterno.

Ah..., essas vontades que tenho

de, com o passar da vida, ter um amor.

 

Entre as pessoas

 

O que dizem?

Meu Deus! Quanta bobagem.

Olhe que eterna bobagem;

é a vida que induz ao suicídio.

Quando se morre

o que fica não é imagem.

 

Entre os tempos

 

Depressa! Ajeite o cabelo.

A viagem só começa

quando o mundo acaba.

 

Entre as vidas

 

Jogarei a primeira pedra.

Serei a primeira pedra.

Comerei a primeira pedra.

Ah..., sempre fui pedra.

 

Entre dois segundos

 

Um pássaro canta.

Essa vida passa.

A utilidade como está

é a coisa mais inútil

na vida de um homem

em que a alma grita.

 

Entre os escritos

 

Quando minha alma grita,

entre bocejos, escrevo.

Quando já é tarde demais

vejo que tudo é útil.

Mantenho-me em segredo.

 

Entre os dias

 

Vá, pegue sua vida e saia correndo.

Vá, mas vá depressa.

Não quero que tua vida acabe morrendo.

 

Entre os poetas

 

Mantenha a poesia

em estado de choque;

assim ela não morre

por falta de vida.

 

Entre valores

 

O poeta vende seu livro:

− Compre aqui, senhor; para ti estes versos não têm valor, mas para mim eles são únicos e eternos.

Ao que o senhor responde:

− Onde pensas que estás? Se fores único, valor para mim não tens. Se, para ti, eles são eternos, fique com ele, se tens valor para ti, valorize-o.

O senhor não tinha valor nenhum.